quarta-feira, 13 de julho de 2011

Relatório do componente curricular EDC C97 – TEE Etnolazer, Cultura e Atos de Currículo

Entretecendo o Etnolazer

Este relatório tem como objetivo expressar relevantes considerações resultantes das apreciações, por mim realizadas, nos vários encontros ocorridos durante o curso da disciplina “Etnolazer, Cultura e Atos de Currículo” que é ofertada pela Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal da Bahia (UFBA).  Aspectos que foram analisados levando em consideração o propósito do diálogo aberto para a construção da noção de Etnolazer, entendida como uma manifestação multirreferencial no estudo dos grupos culturais diversos em suas relações com os atos formativos do sujeito aprendente.
Refletir a respeito do Etnolazer e Cultura é levar em consideração a existência da diversidade cultural, algo que entendo como sendo a riqueza e a variedade do mundo natural. Natural no sentido de que todos somos seres pertencentes a um mecanismo no qual as nossas necessidades de sobrevivência são as mesmas independentemente de etnia, afirmação identitária ou segmento social. É importante salientar que essa diversidade cultural advém de um processo muito peculiar na formação dos povos no qual o aspecto mais significativo encontra-se na miscigenação decorrente da “união” das três matrizes: o negro, o índio e o branco.
Uma educação que tem como objetivo o respeito à diversidade, à diferença deve sempre direcionar-se para a construção de conhecimentos e realização de ações que proporcionem e valorizem o desenvolvimento integral e pleno das potencialidades de todos os indivíduos pertencentes aos mais variados grupos culturais. Nesse contexto, o etnolazer procura identificar elementos que nos permite refletir sobres os aspectos formativos dos indivíduos inseridos ou não nos espaços educacionais por meio dos atos de currículo. Atos estes que precisam entrar em sintonia com as culturas tradicionais e com aquelas que emergem a fim de dialogarem constantemente rumo ao fortalecimento e amadurecimento das idéias propostas pelo que se entende por etnolazer.
A necessidade de fomentar o diálogo acerca do lazer a fim de contribuir com discussões na construção da noção do etnolazer nos possibilitou uma variedade de experiências. Um desses momentos de vivência foi à visita ao Centro Cultural Solar Ferrão: magnífico espaço de arte, cultura e memória localizado no bairro do Pelourinho, Salvador-Bahia. Nesse foi possível presenciar importantes exposições como, por exemplo, a fantástica “Panáfrica” ou “Sete Áfricas”, que revelam a pluralidade e o refinamento da produção artística africana numa espécie de viagem às raízes culturais do Brasil, além de retratar o olhar africano a respeito dos “povos invasores”. Trata-se de uma exposição com vasta coleção doada pelo industrial italiano Cláudio Masella ao governo do Estado da Bahia, em 2004.
Outro momento que deve ser citado foi quando houve a exibição do filme Laranja Mecânica, que nos mostrou uma realidade ainda chocante, apesar de ter sido lançado na década de 70. Um filme revelador que se apóia na psicologia para tentar entender os aspectos geradores da violência. Esta ora praticada por um grupo de jovens, que possivelmente seriam rotulados como delinqüentes, ora praticada pelo Estado na tentativa de “curar” a violência usando mecanismos nada convencionais.
A disciplina “Etnolzer, Cultura e Atos de Currículo” permitiu também a desconstrução de algumas idéias a respeito de determinados grupos da sociedade, por exemplo, a cultura punk. Esta tem como algumas de suas características o princípio da autonomia, o interesse pela aparência agressiva, a subversão da cultura. Ou seja, um novo tipo de comportamento que trouxe novas expressões lingüísticas, símbolos e códigos de comunicação.
Assim entende-se o etnolazer nas suas relações com a cultura e os atos de currículo mediados pelos estudos dos comportamentos particulares de cada tribo cultural sejam punks ou hip-hop, sejam grafiteiros ou cordelistas. Podem ser citadas ainda as manifestações populares encontradas nos grupos de capoeira, nas culturas híbridas, enfim, na etnomúsica buscando por meio dessas e outras expressões culturais estudá-las,

em seu éthos formativos, através de expressões, vibrações, vivências e experiências culturais, desenvolvidas pelos sujeitos em seus cotidianos, realizadas em seu tempo livre buscando privilegiar o aspecto ontocultural do lazer, em seu sentido pleno de licitude. Ao ter a idéia de cunhar este termo tomamos como base os etnométodos pelos quais as pessoas criam e recriam suas próprias culturas de lazer” (SANTOS, R. A. 2010).

Desse modo, por meio do diálogo aberto foram realizadas duas rodas de conversas com presenças ilustres que contribuíram sistematicamente para noção do etnolazer. Essas rodas de conversas motivaram discussões que abrangeram desde as relações do etnolazer com a identidade cultural até as concepções que envolvem a educação, o etnolazer e a diversidade cultural.
Na primeira roda de conversa fomos contemplados com a presença do Profº Drº Roberto Sidnei Macedo (UFBẠ). Nesta foi possível apreender que desenvolver atos de currículo centrados em apenas uma única história é um erro muito grave para a formação de sujeitos aprendentes e viventes numa sociedade tão pluricultural. Isso porque as culturas jamais podem ser hierarquizadas. A valorização deve estar presente em todo o tipo de cultura seja ela a clássica, a tradicional e até mesmo a popular. Todas são dotadas de saberes que, de certo modo, contribuem fortemente para a construção do conhecimento. Destarte, devemos estar aberto a todo o tipo de diálogo para que sejamos cada vez mais possuidores de uma visão critica da sociedade. Crítico no sentido de conhecer, entender, reconhecer e respeitar esse Multiculturalismo fortemente presente no mundo que vivemos.
Na segunda roda de conversa fomos agraciados pela presença do cordelista e professor Sérgio Bahialista (Cordel pendurado na urbanidade da educação), Josenilda Débora (Nilldinha – Educação e Hip Hop) e também com a participação de Júnior Pataxó (Culturas Indígenas e sua relação com a educação). Nesse encontro, foi possível apreender o propósito do cordel, o trabalho do hip hop em proporcionar reflexões sobre o contexto cultural do negro e sua relação com a educação e a sociedade, e por fim, o fascinante mundo cultural dos indígenas que muito significaram (e ainda significa) para a formação do povo brasileiro.
De fato foi um encontro no qual se evidenciou as características da literatura de cordel como um movimento que busca a quebra da linearidade da prática pedagógica baseada no pensamento positivista (uma única concepção de cultura). Essa quebra deve-se ao encantamento que o cordel nos oferece por permitir a entrada no mundo simbólico, no faz de conta, na imaginação e criatividade sempre buscando novas corporeidades – trazer uma “descolonização” para ter um novo olhar sensível para a diversidade cultural.
Assim, o cordel traz um novo saber nessa contemporaneidade em que os conceitos, os paradigmas vão sendo quebrados. Trabalha-se agora com noções buscando novos sentidos levando em conta a pluralidade cultural, a diversidade cultural existente em nossa sociedade. Culturas que outrora foram negadas por conta do etnocentrismo, ou até mesmo por conta dos currículos fundamentados na visão eurocêntrica.
Vale ressaltar, também, que o cordel funciona como instrumento de mobilização social graças ao seu caráter maleável, flexível no que se refere ao teor dos seus escritos a fim de nos fazer repensar a respeito de uma nova prática pedagógica sem a rigidez fabril de moldes depositários de conteúdos.
Quanto ao hip hop, entende-se que é uma manifestação cultural que nos proporciona a reflexão acerca da visão do negro no mundo. É um meio de reconhecer a sua importância na formação da sociedade, principalmente, a brasileira que tem como característica a imensa riqueza cultural, conseqüência da diversidade do seu povo.
É de suma importância o trabalho do hip hop com as crianças, principalmente as crianças negras, por entender que elas se encontram em processo de formação identitária e podem se tornar multiplicadoras desses ideais na sociedade em que vivem. Ou seja, fazer com que essas crianças tenham orgulho de assumir a sua identidade enquanto sujeito pertencente àquela etnia, além de quebrar o preconceito em torno do movimento uma vez que suas letras evidenciam esse orgulho e buscam a mobilização social.
É através desses propósitos que o etnolazer vem se consolidando como um conceito em construção graças à receptividade e à abertura dialógica que mantém respeitando sempre a diversidade cultural em seu éthos formativo – sua fonte de estudo – e, baseando-se constantemente no aspecto multirreferencial como fomento das suas análises. Sem dúvidas esses dois encontros, assim como as aulas, traduziram-se em momentos de inesquecíveis expressões fundamentais para esse caminho que ao ser trilhado solidificará as bases da noção do etnolazer.
Enfim, foram experiências enriquecedoras e que contribuíram bastante para o meu desenvolvimento enquanto sujeito aprendente da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e, principalmente, enquanto pessoa, ser humano que busca cada vez mais um olhar sensível para todos os grupos culturais nas suas mais diversas expressões. Isso por entender o quanto é importante o respeito à particularidade e à diversidade cultural, às concepções de lazer dos grupos culturais, enfim, entender que fazemos parte de um multiculturalismo tão forte e evidente, o que nos torna seres contemplados com tamanha riqueza.

Obs.: A citação inserida neste relatório com a referência SANTOS, R. A. 2010, é de autoria do Profº Drº Romilson Augusto dos Santos – professor do componente curricular EDC C97 – TEE Etnolazer, Cultura e Atos de Currículo.

Autoria: Kleriston Conceição - Sujeito educando implicado com o componente curricular EDC - C97 Etnolazer, Cultura e Atos de Currículo dos cursos de Pedagogia e Educação Física - FACED/UFBA.

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